A necessidade de ampliar ainda mais os principais aeroportos da Infraero, mesmo diante de uma crise econômica, política e institucional que se arrasta a mais de dois anos, com queda na demanda do transporte aéreo, foi o argumento do ministro dos Transportes, Maurício Quintella, para justificar a concessão de quase vinte aeroportos da estatal, em audiência realizada nessa quarta-feira (13/9), na Câmara dos Deputados.
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Mesmo diante de uma sala cheia de trabalhadores da empresa e das falas de parlamentares afirmando as contrariedades desse discurso, Quintella argumentou que a Infraero ainda seria viável, mesmo depois da concessão dos aeroportos mais rentáveis, e que o governo não pretende extingui-la, nem privatizá-la, mas manter suas operações e ainda oferecer ações da empresa na Bolsa de Valores.
Os estudos feitos pela empresa, presidida por Antônio Claret, demonstrando superfaturamento em contratos promovidos pelas concessionárias que administram os seis primeiros aeroportos concedidos, ou de que a União teria que investir cerca de 3 bilhões por ano para manter as operações dos aeroportos deficitários, caso Congonhas e outros aeroportos sejam concedidos, também foram praticamente desconsiderados pelo ministro.
Quintella reafirmou na audiência que “não há nem nunca houve proposta de privatizar a Infraero” e disse que em noventa dias o governo terá concluído um estudo de viabilidade da estatal, levando em conta a perda desses novos aeroportos, para abrir o capital da empresa e lançar ações na Bolsa. A estratégia não faz sentido, a não ser que a intenção do governo seja extinguir a Infraero, pois quem iria ficar com uma empresa sem ativos rentáveis, questionaram os parlamentares e os representantes do Sindicato Nacional dos Aeroportuários (Sina).
Qual a justificativa para investir em obras de ampliação a passos largos, em meio a uma crise que reduz a demanda, ou para conceder mais aeroportos, tornando deficitária uma estatal que sempre deu resultado positivo antes das concessões, e que, mesmo com as já realizadas, vem equalizando suas contas para voltar ao azul. Nenhuma dessas perguntas foi respondida. “O governo está se rendendo aos interesses dos empresários. Não faz sentido abrir mão de aeroportos rentáveis”, afirmou o deputado federal Elvino Bohn Gass.
A ausência do ministro Moreira Franco, responsável pelo programa de parcerias do governo com a iniciativa privada, idealizador dessas concessões, também foi amplamente criticada pelos parlamentares. A deputada federal Erika Kokay, que requereu a audiência, questionou veementemente a ausência de Moreira Franco, principalmente porque o governo solicitou a cortesia do Legislativo de substituir a convocação por um convite, afirmando que o ministro participaria mesmo dessa forma, o que não ocorreu. A situação levou os parlamentares a afirmarem que irão convocá-lo para uma próxima reunião da Comissão, para que não possa se ausentar.
Kokay também elogiou as manifestações de aeroportuários em cerca de 20 aeroportos da Infraero, no último dia 12, no Dia Nacional de Luta em defesa da estatal, e ressaltou o papel fundamental da Infraero na integração, soberania e segurança nacional. “O governo Temer quer tornar a Infraero insolvente para poder privatizá-la”, afirmou a parlamentar.
Os deputados também questionaram Quintella sobre possíveis casos de corrupção envolvendo as concessões e as obras nos aeroportos concedidos, uma vez que ocorreu na Petrobras, e as empreiteiras que atuam nos consórcios que assumiram esses aeroportos também estão sob investigação da Lava Jato.
O presidente do Sina, Francisco Lemos, destacou que Moreira Franco foi quem assinou o acordo conquistado pelo Sindicato, depois de meses de luta em defesa da Infraero (antes das primeiras concessões), garantindo estabilidade aos trabalhadores da estatal até 2020. “Sem esse acordo, os aeroportuários da Infraero já estariam demitidos”, ressaltou Lemos. O presidente do Sina também ressaltou que a luta dos aeroportuários em defesa da Infraero não é corporativista, focada apenas na manutenção dos empregos, e sim uma luta maior, em defesa da empresa brasileira de infraestrutura aeroportuária, cujo papel é essencial para o desenvolvimento econômico do país e para o acesso da população brasileira ao transporte aéreo.
“Estamos lutando para salvar e ampliar a Infraero, não diminuí-la, não conceder mais aeroportos, como o de Vitória, que acabou de receber milhões em investimentos e está na lista de concessões”, afirmou Lemos. “Como a Infraero vai continuar viva sem os órgãos vitais? Vocês estão levando o que está mantendo o pulso dela pulsando”, disse Lemos ao ministro Quintella. “E que pare, nesse momento, o processo de privatização de aeroportos”, completou.
Quintella respondeu dizendo que, apesar da ausência de Moreira Franco na audiência, o governo irá cumprir o acordo, e que os trabalhadores só estão saindo da Infraero via plano de demissão voluntária, como permite a lei. O ministro, no entanto, alegou que as cerca de 24 mil ações movidas contra a Infraero, sendo aproximadamente 70% delas ações trabalhistas, prejudicam a manutenção da empresa.
Quintella afirmou que Congonhas é o principal ativo da Infraero e que, na “ótica” dele, o aeroporto não deveria ser concedido nesse momento, mas que aqueles que entendem que Congonhas deve ser concedido venceram essa discussão dentro do governo Temer. Disse também que é possível que o governo Temer não consiga, em tempo hábil, realizar todo o processo que pode levar à concessão desses terminais.
Ao final da audiência, após parlamentares e sindicalistas exigirem que o assunto seja discutido à altura da sua complexidade, Quintella afirmou que o governo fará audiências públicas para discutir as novas concessões antes que elas aconteçam.
Concomitante à audiência sobre a Infraero, em outro local da Câmara, foi promovido um seminário com ampla participação de trabalhadores de empresas públicas e deputados que compõem a frente parlamentar em defesa das estatais, contra o pacote de mais de 50 privatizações desejado pelo governo Temer. Enquanto isso, o noticiário nacional deu destaque para a audiência no Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de nova denúncia contra Temer, à audiência judicial com o ex-presidente Lula e às prisões dos irmãos da JBS.